openSUSE Tumbleweed
Olá amiguinhos, como vocês estão?
Engraçado como, de tempos em tempos, o nosso cérebro nos faz lembrar de coisas que havíamos esquecido completamente.
Esses dias eu estava assistindo alguns vídeos sobre retro computing, em especial sobre o IRIX OS, sistema operacional desenvolvido pela Sillicon Graphics e que rodava quase que exclusivamente em suas poderosas workstations baseadas em MIPS:
Apenas como curiosidade, esses mesmos computadores foram usados como adereços no filme Jurasssic Park, na famosa cena em que a personagem Lex (interpretada pela atriz Ariana Richards) exclama:
De forma completamente aleatória, eu comecei a me lembrar dos incríveis ambientes desktop que costumavam acompanhar as mais diversas distribuições Linux: Window Maker, IceWM, Xfce, FVWM, entre outros acrônimos e siglas que, na época, despertavam discussões acaloradas sobre qual era o desktop mais bonito, qual o mais leve, etc.
Depois, comecei a me lembrar dos primórdios do Linux no Brasil como um todo e de como a única maneira viável de instalar as diversas distribuições existentes era por meio de revistas de computação que encartavam CDs com esses sistemas (Revista do Linux, Geek, Revista do CD-ROM).
Por sua vez, isso me lembrou de como, uma vez, um colega da escola foi até a Fenasoft e voltou com uma novíssima distribuição (pelo menos para mim). Ela vinha em uma caixa verde e branca e continha um baita dum manual com mais de 400 páginas (em inglês, claro) e incríveis 7 CDs lotados de pacotes prontinhos para serem instalados. Essa distribuição, meus caros, chamava-se SUSE Linux 🦎
A Jornada da SUSE
Antes de falarmos sobre o Tumbleweed, acho que vale a pena recapitular a história da empresa.
A história da SUSE começa em 1992, não como uma empresa, mas como um projeto de quatro amigos alemães: Roland Dyroff, Thomas Fehr, Burchard Steinbild e Hubert Mantel, todos ainda estudantes. O nome "SUSE" é um acrônimo de "Software und System-Entwicklung", que, em alemão, significa "Desenvolvimento de Software e Sistemas". Curiosamente, o mascote característico, o camaleão Geeko, foi adotado mais tarde, em 1994, simbolizando adaptabilidade e versatilidade.
Inicialmente, a empresa focava em consultoria e elaborava manuais sobre UNIX. No entanto, o panorama da computação estava prestes a mudar com o surgimento do Linux. Inspirados por essa nova onda, eles lançaram, em 1994, a primeira versão da sua distribuição: o SUSE Linux 1.0. Diferente de outras distribuições da época, que muitas vezes eram conjuntos de disquetes, a SUSE foi uma das primeiras a ser lançada em CD-ROM, incluindo, já na caixa, um sistema completo e o ambiente de desktop X Window System.
O grande marco que definiu a identidade da SUSE para sempre foi o desenvolvimento da ferramenta YaST (Yet Another Setup Tool). Este utilitário de configuração do sistema, extremamente poderoso e fácil de usar, tornou a instalação e administração do Linux acessíveis para muito além dos círculos de especialistas. O YaST se tornou a alma da distribuição.
Nos anos 2000, a SUSE consolidou-se como uma das principais distribuições no mercado corporativo. Em 2004, foi adquirida pela empresa americana Novell, que investiu pesadamente no desenvolvimento de sua versão para servidores e empresas: o SUSE Linux Enterprise Server (SLES), conhecido por sua extrema estabilidade e suporte de longo prazo.
Um novo capítulo crucial começou em 2011, quando a empresa britânica Micro Focus adquiriu a Novell. Mais importante ainda, em 2018, a SUSE ganhou nova independência e fôlego ao ser vendida à sueca EQT Partners, uma empresa de private equity. Essa mudança permitiu que a SUSE acelerasse sua inovação e expandisse suas operações de forma agressiva.
Hoje, a SUSE é a maior empresa de código aberto independente do mundo. Seu portfólio vai muito além do sistema operacional de servidor, incluindo soluções para Kubernetes (Rancher), computação em nuvem e edge computing.
openSUSE
Ainda em 2005, a Novell decidiu tornar o desenvolvimento do sistema mais transparente e colaborativo. Eles criaram um canal de desenvolvimento aberto, chamado openSUSE, convidando a comunidade global a participar ativamente do processo.
O marco oficial do nascimento do projeto foi o lançamento da versão 10.0, em outubro de 2005, que foi a primeira versão totalmente desenvolvida de forma aberta e disponibilizada gratuitamente para download.
Desde então, o openSUSE passou a ser a base da qual a SUSE extrai e aperfeiçoa seu produto corporativo (um arranjo bem parecido com o Fedora/RHEL). É no caldeirão de inovação do openSUSE que novas ferramentas, ambientes de desktop e pacotes de software são testados e amadurecem antes de serem incorporados à versão enterprise.
Hoje, o projeto é conhecido por suas duas versões principais:
openSUSE Tumbleweed: Uma distribuição "rolling release" sempre atualizada e extremamente estável.
openSUSE Leap: Uma distribuição com lançamentos regulares que compartilha sua base de código diretamente com o SUSE Linux Enterprise, garantindo estabilidade e qualidade.
Bem, sem mais delongas, vamos falar sobre a nossa estrela principal 🍻
Tumbleweed
Como já foi comentado, o Tumbleweed é um sistema “rolling release”. Existe uma analogia que eu gosto bastante e que exemplifica bem como esse modelo de distribuição de software funciona:
Imagine o mercado automobilístico. No modelo vigente, as empresas desenvolvem novos veículos todo ano. Se você quiser a versão mais recente do seu carro, você precisa obrigatoriamente comprar um novo modelo completo e “abandonar” o modelo antigo.
Já no modelo rolling release, o mesmo carro vai recebendo peças novas e melhoradas constantemente, evoluindo e se mantendo sempre moderno, sem que você precise trocá-lo por um modelo totalmente novo, incluindo-se aí o motor do carro 🚗
Eu não vou cobrir o processo de instalação do Tumbleweed, até porque ele é bem direto. Selecione o ambiente gráfico, crie um usuário e o instalador cuida automaticamente das configurações de rede e do particionamento de disco - inclusive criando subvolumes Btrfs e snapshots automáticos (mais sobre esse recurso em instantes).
O que me chamou bastante atenção foi o cuidado com os detalhes. A impressão que tive é de que todos os padrões escolhidos foram pensados com muito esmero. Por exemplo, há apenas dois temas instalados por padrão, mas ambos são lindíssimos e completos. O layout inicial do desktop é extremamente funcional. Se você não liga para customizações e coisas do tipo, sua experiência de uso vai ser instalar e já sair usando o Tumbleweed. Tudo vai funcionar de primeira.
A segunda coisa de que mais gostei no OpenSUSE Tumbleweed foi o YaST. Para um cara nostálgico como eu, usar o YaST é como usar o SMIT no AIX (idosos entenderão). O YaST se propõe a ser um ponto central de configuração do sistema e, em geral, cumpre bem essa função. Porém, apesar de alguns dos módulos do YaST serem realmente bons (como o particionador de discos), outros módulos não são assim tão úteis, ou melhor, parecem estar meio “desacoplados” das principais ferramentas de configuração modernas. Explico:
Configurei o hostname da minha máquina com o comando hostnamectl, como faço em todas as minhas máquinas Fedora/Ubuntu. Depois, fui fazer alguma outra coisa no YaST e decobri que ele possui um módulo chamado Hostnames. Ao iniciá-lo, percebi que algo errado não estava certo:
Muitos podem alegar que esse comportamento existe para dar flexibilidade aos usuários/administradores de sistemas, então você tem várias ferramentas que desempenham a mesma função, etc., etc., etc. Na minha opinião, se uma ferramenta se propõe a ser o ponto central de configuração do sistema, ela deve desempenhar essa função de forma integral de modo a evitar essas ambiguidades.
Tirando esse pequeno detalhe, usar o YaST ainda é a melhor maneira de administrar o seu sistema. Tem coisas realmente bacanas lá, como a administração de recursos de virtualização, firewall, um frontend para o journalctl que facilita bastante a filtragem das mensagens de erro, entre muitos outros recursos bacanas.
Instalar pacotes também é muito fácil, apesar do Xfce não trazer, por padrão, nenhuma ferramenta de gerenciamento de pacotes ou mesmo uma lojinha. Para tal, você pode usar o YaST (ele de novo) ou utilizar o comando zypper:
zypper install (ou zypper in) para instalar pacotes
zypper update (ou zypper up) para atualizar os pacotes
zypper dist-update (ou zypper dup) para atualizar o sistema como um todo
O zypper é uma ferramenta bem bacana e versátil que faz mais do que gerenciar pacotes. Ele também gerencia serviços, locales, licenças de software, dentre outras coisitas.
A terceira coisa de que eu mais gostei no OpenSUSE foi a configuração automática de snapshots. Tal como mencionado anteriormente, o Tumbleweed é instalado por padrão com o sistema de arquivos Btrfs, e a ferramenta Snapper é configurada para criar snapshots automáticos antes de cada atualização.
Se uma atualização causar algum problema (um pacote quebrado, driver com falha), você pode simplesmente reiniciar o computador, escolher bootar a partir do snapshot anterior no menu do GRUB e reverter todo o sistema ao estado perfeito de antes da atualização em segundos. Para mim, que já sofreu bastante ao tentar instalar aquele novo driver maroto da NVIDIA e acabou com uma tela preta e um prompt piscante, esse é um recurso fundamental e que deveria vir habilitado por padrão em todas as distribuições 👾
Considerações finais
Em resumo, o que mais gostei no Tumbleweed foi o fator turnkey: instale o sistema e ele já estará pronto para uso. Independentemente da sua escolha de ambiente gráfico, você terá à disposição um conjunto básico de ferramentas e programas que não vão te decepcionar e permitirão que você use o sistema imediatamente. Se precisar de mais aplicativos, basta recorrer ao YasT ou à linha de comando e um universo de possibilidades abrir-se-á à sua frente. No fundo, o Tumbleweed é uma distribuição que respeita a inteligência e o tempo do usuário. Os padrões foram bem pensados e resolvem problemas reais de maneira muito prática e intuitiva.
Após anos usando o Fedora, talvez seja a hora de experimentar algo diferente.